sábado, 17 de maio de 2008

O RASTO DE LUZIA

A voz dela no silêncio foi numa manhã com pardais e penitências. Havia uma bulha de crianças, um carro de polícia rondando as cercanias. Veio do sonho pôr termo ao sono; em vigília, os mártires sangravam no horizonte, feito constelação em junho. Algo nela supliciava uma antiga chaga, disfarçava uma vocação para espantalho; o batom muito doido que ela usava ou seu perfume desviava minha inclinação para lides de padres. Um treco inefável nela me fazia grande, chamava-me para a vida possível com seus andrajos e suas belezas, a voz de Deus e seus desafios, o trem de carga, o combate, a fuligem, a mesa com moscas e bibelôs orientais. Era bonita como fogo de obus, bela como as intenções do alferes. Foi nácar para os olhos moribundos, sândalo nas narinas dos desesperados. Numa esquina, melhorou os acordes que um diabo dedilhava numa viola velha. Para estar apta para gozo como ela uma menina verteu. Talvez fosse Marisa, sua presença ameaçasse a verdade da morte e do ódio com poderes de fada, fogo, furor, brisa. Segui seu rasto por nove trilhas; nove vezes chamei seu nome. Perdi-a Sua presença aqui veste-se de dor. Faz sentido.

Erorci Santana

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